quinta-feira, 15 de junho de 2017

joaninhas

1.
o homem que morreu era tão grande
cobrindo imensa nuvem o horizonte
a tempestade mãe de nossas fontes
certeza de não morrermos de sede

o homem-nuvem era um gigante
voando sempre um pouco a nossa frente
puxando nossos passos pra adiante
involuntário como a gravidade

extinta sua gravidade aérea
os nossos passos ficam mais pesados
qualquer a frente soa arbitrário

extinta a generosa umidade
o nosso respirar fica precário
e a nossos olhos cabe a tempestade

2.
o mundo sem João não é o mundo
é cópia reprográfica do mundo
desadequada estéril derrepente

o mundo sem João é coisa insossa
comida com sabor de detergente
como se arroga o mundo de ser mundo
sem João rindo do mundo com a gente?

3.
tem gente que é parida de um tamanho
que o corpo não encaixa o conteúdo:
o todo é insuficiente para o tudo
o existir em si já é extranho

mas sendo extranho, que não seja mudo:
estando mudo, qual será seu ganho?
melhor parecer louco que rebanho:
extranho louco feio cabeçudo

em ti achei o espelho em que me banho
e apercebi que nosso ser extranho
é extranho de bonito, sobretudo
4.
assim como os seus meu par de óculos
o dia passa entre odisseias
viaja desde a ponta do nariz
à ponte entre olho e as sobrancelhas

assim como o seu esse meu rosto
se desfigura pra cada sorriso
os olhos se escondem de vergonha
do dente amarelo e impreciso

assim como os seus os meus chapéus
reclamam por um dono cuidadoso
e como seu cabelo assim o meu
varia entre o bonito e o seboso

assim como o seu quero meu corpo
em morto enterrado em roupa preta
pra já descer da barca de caronte
malhando de porrada o capeta




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